sábado, 26 de junho de 2010

26/06/2010 - Programa sobre Cenair Maica


No dia 03 de maio de 1947, na localidade de Águas Frias, município de Tucunduva, nascia um menino que se tornaria um dos maiores cantores e divulgadores da região missioneira: Cenair Maicá. Filho de Armando Maicá, popularmente conhecido por “seu Mandico”, e Orcina Lamarque Maicá, desde a infância acompanhou seus pais na travessia do rio Uruguai, mantendo contato com as duas pátrias: Brasil e Argentina. Conhecia a realidade social dos dois lados. Cenair se criou no meio de balseiros e pescadores, vivendo nas carreiras (acampamentos no meio do mato) que existiam tanto do lado brasileiro quanto do lado argentino. Pelo fato dos pais residirem na Argentina, estudou o primário no colégio General Belgrano, em Três Pedras, Oberá (Misiones). Nesta localidade também conheceu um dos seus primeiros incentivadores para a arte da música, um paraguaio de nome Fernandes, que lhe ensinou a dedilhar o violão.
Aos três anos, Cenair cruzou a fronteira com sua família para viver em acampamentos de extração de madeira às margens do Uruguai.
Este dado foi decisivo para a formação de sua personalidade musical. Criado no meio de madeireiros, balseiros e pescadores, absorveu desde cedo a musicalidade de suas formas de expressão. Com os peões argentinos e paraguaios que trabalhavam com seu pai, Cenair aprendeu os primeiros acordes da guitarra.
Quando era piá, ouvia histórias dos povos latino-americanos e das barbáries cometidas contra os índios. Mais tarde sofreu com a dura realidade do homem rural. Porém, também vivenciou momentos alegres em festanças com gaita e violão, o que lhe motivou a aprender a tocar.
Cenair Maicá apresentava em seu trabalho a relação com o rio Uruguai; a preocupação com os problemas do homem rural e o destino “dos herdeiros de São Miguel” que viviam à beira das estradas artesanando balaios para pão e “pinga”.
Esta convivência no meio de madeireiros, balseiros e pescadores, despertaria nele outro traço comum aos troncos missioneiros: a postura fraternal para com os países vizinhos. Pode-se ouvi-lo dizer na entrevista gravada no Museu Antropológico Augusto Pestana: "A história missioneira não pertence somente ao Rio Grande do Sul, mas também à Argentina e ao Uruguai".
Músico desde os 10 anos de idade — quando começou a se apresentar em público ao lado de seu irmão Adelque — , Cenair fez sua entrada triunfal na história da música gaúcha ao vencer o 7º Festival do Folclore Correntino em 1970, em Santo Tomé, na Argentina com Fandango na Fronteira. Na apresentação, Cenair dividiu o palco com quem a havia composto: Noel Guarany. Foi a consagração de ambos e de cada um como artista e também dos esforços iniciados pelos dois e por Ortaça em 1966, quando lançaram um manifesto reivindicando a herança guarani e anunciando a intenção de criar, a partir dela, uma nova arte missioneira.
A vitória no 7º Festival do Folclore Correntino em 1970, em Santo Tomé, na Argentina rendeu a Cenair e Noel a gravação de um disco compacto, Filosofia de Gaudério (1970).
Em 1978, Cenair lançou "Rio de Minha Infância", o primeiro de sua carreira solo. Solo talvez não seja a palavra adequada: a produção e a direção couberam a Noel, autor, também, de quatro das dez músicas que o integram.
Nas canções "Homem Rural" e "Balaio", "Lança e Taquara", Cenair fala das agruras que atravessava a gente simples do interior gaúcho: camponeses, balseiros, índios... já na canção "João Sem Terra", Cenair satiriza a política habitacional do regime de 64 descrevendo as agruras imaginárias de um conhecido passarinho: "Ainda bem que o João Barreiro não precisa de alvará: não paga o BNH e usa o barro brasileiro. Mas te cuida, João Barreiro, que os 'hôme' vão te pegar...".
Com sua voz encorpada e ao mesmo tempo suave, Cenair gravou indelevelmente também seu nome entre os grandes da arte popular gaúcha. Homem e artista da melhor extração missioneira, colocou sempre sua voz e seu talento a serviço de sua terra e de sua gente. A exemplo e ao lado dos outros "troncos missioneiros" (seus parceiros e amigos Noel Guarany, Jayme Caetano Braun e Pedro Ortaça), personificou a identidade histórica e cultural de sua região. Também junto a eles, foi responsável por inserir as Missões no mapa histórico e cultural oficial do estado, desencadeando a redefinição de uma identidade gaúcha até então calcada quase exclusivamente na exaltação dos senhores feudais da região da campanha.
Cenair sabia dos obstáculos que existiam no caminho que escolheu. O enfrentamento com os monopólios fonográficos fazia parte de suas preocupações. "As multinacionais do disco infiltravam a música norte-americana" — recordou em uma entrevista, realizada em 1982 no Museu Antropológico Augusto Pestana — "mas nós tínhamos um compromisso de manter a cultura missioneira". Nisto, como em muitas coisas, comungava das mesmas idéias de seu parceiro Noel Guarany.
Cenair Maicá é, hoje, uma referência para todos aqueles que se propõem defender o patrimônio natural, histórico, cultural, econômico e, principalmente, humano do Rio Grande do Sul.
Cenair Maica conseguiu casar a música com a poesia, mostrar realidades sociais que eram “esquecidas”. Como ele mesmo destacou, o problema que aflige o homem do campo merece destaque igual, ou maior, ao dispensado às músicas que tematizam sobre amor ou boemia. Essa preocupação fica explícita na milonga “Homem rural”, onde é possível notar a realidade social dos trabalhadores, seja da cidade ou do campo, simbolicamente na expressão: “enxada em terra alheia nunca traz dia melhor”.
A biografia de Cenair tem também um outro aspecto — este de cunho trágico — Cenair viveu pouco. Aos 17 anos de idade, num acidente, Cenair perdeu um rim, o que veio, mais tarde a comprometer sua saúde e influenciar em seu falecimento, em 02/01/1989, após passar por um transplante. Em 1984 iniciaram os problemas de saúde, e o rim que ainda possuía começou a falhar. Necessitou fazer hemodiálise, debilitando ainda mais a saúde. Finalmente, em 1985 realizou o transplante de um rim, sendo o doador o irmão Darci Maicá. A penúltima internação hospitalar, em dezembro de 1988 teve como objetivo colocar uma prótese femural.
Em 2 de janeiro de 1989, Cenair Maicá falecia, deixando em seu registro musical um atestado de amor às suas origens e a prova de que através da música era possível contar a história de forma popular, dando voz à memória coletiva, alertando a todos dos erros cometidos no passado e a necessidade básica de fortalecer a identidade para construção de um futuro mais humano e social.
Foi construído um mausoléu na entrada do Cemitério Sagrada Família em Santo Ângelo, para homenagear o cantor, compositor e poeta missioneiro, Cenair Maicá.
Cenair deixou uma rica herança musical e suas composições, mesmo escritas há várias décadas, não perdem a atualidade. O mausoléu tem dois pilares, um representando a música e o outro a poesia, com uma frase no centro :"Se meu destino é cantar, eu canto". Logo abaixo da inscrição, Cenair Maicá, Cantor Missioneiro, estão mais duas citações. Ao lado da data de nascimento e da sua morte, constam "Nasce o poeta" e "O mundo fica mais triste". Capas de seus discos e fotos também estão no local.
Outras duas marcas constantes do mausoléu, são a cruz missioneira e um violão, símbolo e material que Cenair sempre carregava, no peito e nos braços.


Foto da Inauguração do Mausoléu em Santo Ângelo

sábado, 19 de junho de 2010

19/06/2010 - Programa sobre João de Almeida Neto


João de Almeida Neto é músico, cantor, compositor e advogado. Considerado pela crítica musical como um dos importantes intérpretes da música regional gaúcha, “A Voz do Rio Grande” é um dos artistas mais premiados em festivais nativistas.
Terceiro filho de Moacir Duarte de Almeida e Elza Pansardi de Almeida, nasceu à uma hora da madrugada do dia 23 de novembro de 1956, em Uruguaiana, município da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, às margens do Rio Uruguai, limítrofe com a Argentina e o Uruguai.
Sua infância foi dividida entre a Rua Domingos de Almeida e os campos do Touro-Passo, sub-distrito de Uruguaiana, há 30 km da sede, onde a família Almeida possuía uma propriedade rural. Nesse lugar, ainda muito pequeno, teve seu primeiro contato com a música através de um peão chamado Irineu, apelido “Negro”, que tocava violão e cantava.
Na idade escolar, conforme afirma, ‘teve a sorte e o privilégio” de estudar no Instituto União e, posteriormente, na Escola Elisa Valls. A esses educandários, além da família, credita e agradece a formação do caráter. Com eles conheceu os caminhos da educação e da cultura, e os princípios morais e éticos que nunca abandonou.
No Estádio da Baixada, do Esporte Clube Uruguaiana, adquiriu o gosto pelo futebol, e nas serenatas solidificou, definitivamente, sua paixão pela música e pela poesia. É, ainda, uma forte recordação da sua adolescência as madrugadas varadas de janela em janela.
Nunca conseguiu explicar como, sendo um homem tímido e até mesmo retraído, gosta tanto de carnaval. É um folião ativo e praticante.
Formado em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, atua como advogado, especialmente na conturbada questão dos Direitos Autorais, tendo-se valido das leis, teses e argumentos, para resguardar os direitos dos artistas.
João de Almeida Neto é igual como homem e como músico. O que tem de autêntico, contestador, e sentimental sempre contaminou tanto a sua personalidade quanto seu trabalho.
É um dos grandes nomes da música gaúcha, dono de uma voz forte e de um estilo singular e autêntico de ser e de cantar
O Movimento Nativista, iniciado em 1970, com a Califórnia da Canção, em Uruguaiana, sua terra natal, foi o passo definitivo na consolidação da mudança que se instalaria na música gaúcha. Nessa época, ainda na adolescência, João já havia descoberto seu fascínio pela música. Atuava nas assembléias lítero-artísticas do Instituto União e, junto com alguns amigos, varava as madrugadas, com belas serenatas. Nos bailes, ficava perto do palco para admirar os músicos dos conjuntos.
Ouvia folclore argentino, uruguaio, Chico Buarque, Caetano Veloso, Belchior, Nelson Gonçalves, Paulinho da Viola, entre outros.
Logo se inseriu no Movimento Nativista. Embora ainda piá, quando convivia informalmente com os artistas, nas tertúlias da “Pastoril”, onde se erguia a “Cidade de Lona”. Era a nova geração de músicos assumindo postos, tomando atitudes.
João já residia em Porto Alegre e convivia muito com Luiz Felipe Delgado, também uruguaianense. Cursavam Direito, na Unisinos, mas amavam mais a poesia do que as leis. Por iniciativa do amigo, inscreveram, na Tertúlia Musical Nativista de Santa Maria, uma canção intitulada “Tropeiro Cantor”, que se sagrou vencedora.
Dias depois, realizava-se em Cruz Alta a 1ª Coxillha Musical Nativista. Inscreveu, em parceria com José Luiz Vilella, uma milonga chamada “Meu Canto”, que cantou sozinho, e impressionou o público. Depois de apresentações, naquela noite, de grandes grupos musicais, apareceu aquele rapaz solitário... Foi consagrado. Um detalhe que lhe acabou resultando em lucro foi o de que, por não saber a letra da música de cor, colou lembretes no corpo do violão e, enquanto recorria sutilmente à leitura para continuar cantando, floreava alguns bordoneios. Isso lhe rendeu a fama de bom violonista.
Tempos depois, venceu novamente a Tertúlia, com a música “Nova Trilha”, de sua autoria com Nilo Bairros de Brum. Mais tarde, com a famosa “Vozes Rurais”, teve participação marcante no Musicanto de Santa Rosa, e daí para frente firmou-se como mais um dos “grandes nativistas”.
Corriam os anos 80. Os Festivais se proliferavam pelo interior do Estado. Eram mais de sessenta por ano e João de Almeida Neto tinha participação ativa em todos eles, vencedor em inúmeros deles. Nesse circuito, fértil mercado de trabalho, profissionalizou-se.
Um acontecimento paralelo ajudou a consolidar esse quadro. Foi a abertura do “Pulperia”, bar e restaurante temático gauchesco que abrigou os apreciadores do som rural gaúcho. Local que foi um enorme sucesso, teve João de Almeida Neto como um dos grnandes músicos da casa. Fato digno de registro, porque muito lhe honrou, já que no palco da Pulperia tocou com grandes companheiros, entre os quais Cenair Maicá, Chaloy Jara, e Algacir Costa. Desde então, a história de João de Almeida Neto na música do Rio Grande se confunde com a dos nossos grandes músicos, cantores e compositores.
João viveu e vive esse Movimento Cultural como uma peça da sua engrenagem. Conforme suas palavras, “estive e estarei, sempre que chamado, em todos os palcos erguidos para que se cante a música da minha terra”.
João de Almeida Neto é um músico e orador nato. Não é à toa que é compositor e advogado, e que integrou, como assessor, a equipe do Desembargador Nelson Rassier.
Há alguns meses o cantor Nei Lisboa fez duras criticas à musica gauchesca. João de Almeida Neto foi um dos poucos que soltou o verbo contra Lisboa. Algumas frases em defesa da musica gaucha de João de Almeida Neto:
“Depois de chamar a música gaúcha de “intragável” e os músicos de “absurdamente reacionários”, Nei Lisboa, tentando achar uma explicação para a sua falta de respeito, afirma que quem reagiu aos seus insultos está “amesquinhando o tema”, “interessados em insuflar a defesa” e “dela extrair audiência e patrocínio”.
O que ele queria??? Que ouvíssemos e lêssemos suas ofensas calados???
Ele não conhece sequer uma página da história escrita pelos festivais nativistas e pelos compositores que surgiram no Rio Grande do Sul nos últimos 30 anos.
Ou será, mesmo, que ele acha reacionária a poesia socialmente engajada feita pelo Cenair Maicá, pelo Jayme Caetano Braun, pelo Aparício Silva Rillo, pelo José Hilário Retamozo, pelo Robson Barenho, pelo Sérgio Jacaré Metz, ou pelo Luiz de Miranda e pelo Luiz Coronel, pelo José Fernando Gonzales????
Acha, mesmo, intragáveis as construções harmônicas das composições do Luiz Carlos Borges, do Talo Pereyra, do Marinho Barbará, do Marco Aurélio Vasconcelos, do Sérgio Rojas??? Quando cheguei a Porto Alegre, no início da década de 80, pouco antes do que ele chamou de “boom dos festivais”, as pessoas identificadas com a cultura gaúcha eram ridicularizadas.
O movimento nativista transformou esse quadro. O que era motivo de chacota virou moda e a Capital ficou cheia de jovens usando bombacha e tomando mate pelos shoppings. Nei é uma das poucas pessoas que não se deu conta dessa mudança. Que sono profundo! Que mão embalará seu sono???? A do preconceito???? A da desinformação???? Ou a do ciúme???? “
Este é João de Almeida Neto, autor de "As Razões do Boca Braba", canção com a qual se identifica e que diz, entre seus versos, que é melhor ser boca braba, que não ter boca pra nada.
Participante fiel do Carijo da Canção Gaúcha de Palmeira das Missões o cantor fez juz a sua história musical no palco do festival, na abertura da segunda noite.
O artista, conhecido como "a voz do Rio Grande" apresentou músicas clássicas de seu repertório e emocionou a platéia que há 25 anos participa do festival e não deixou a desejar na sua apresentação no Jubileu de Prata do festival.
João de Almeida Neto tem na alma o Rio Grande do Sul. O Gaúcho se identifica na sua voz, na sua forma altiva de cantar e na importância que dá à cultura.
" Através do “Nativismo” diz João de Almeida Neto, cantamos, difundimos e mantemos nossa identidade. Somos nós mesmos. Realçamos nossas vocações e traçamos nossos destinos, livres e espontaneamente”.
 As fotos são do João de Almeida Neto

sábado, 12 de junho de 2010

12/06/2001 - Programa sobre o chimarrão

Assunção havia-se transformado na pérola das colônias espanholas na América. O general Irala, que numa conspiração derrubara o segundo adelantado (governador de província) e estendera seus domínios às planuras do Pampa, aos contrafortes dos Andes e até Sierra Encantada-Peru, ao Norte, investiu para o Leste e chegou, em 1554 , às terras de Guaíra, atual Paraná. Ali foi recebido por 300.000 guaranis com alegria e hospitalidade, como narra Barbosa Lessa em seu livro "História do Chimarrão". Além da acolhida, o que chamou a atenção foi que os índios de Guaíra eram mais fortes do que os guaranis de qualquer outra região, mais alegres e dóceis. Entre seus hábitos, havia o uso de uma bebida feita com folhas fragmentadas, tomadas em um pequeno porongo por meio de um canudo de taquara na base um trançado de fibras para impedir que as partículas das folhas fossem ingeridas. Os guaranis chamavam-na de caá-i (água de erva saborosa) e dizem que seu uso fora transmitido por tupã.

A palavra chimarrão tem origens no vocabulário espanhol e português. Do espanhol cimarrón, que significa chucro, bruto, bárbaro, vocábulo empregado em quase toda a América Latina, do México ao Prata, designando os animais domesticados que se tornaram selvagens.
"E assim, a palavra chimarrão, foi também empregada pelos colonizadores do Prata, para designar aquela rude e amarga bebida dos nativos, tomada sem nenhum outro ingrediente que lhe suavizasse o gosto." (Elucidário Crioulo, de Antonio Carlos Machado em História do Chimarrão, de Barbosa Lessa, 57).
Marron em português, além de outros significados, quer dizer clandestino, e cimarrón, em castelhano, tem idêntico significado. Ora, sabe-se que o comércio de mate e o preparo da erva foram em tempos passados proibidos no Paraguai, o que não impedia, entretanto, que clandestinamente continuasse em largo uso naquela então colônia espanhola. (Vocabulário Sul-Rio-Grandense, Luís Carlos de Morais, 72, em História do Chimarrão, de Barbosa Lessa, 57).

Roberto Ave-Lallemant (1812-1884) visitando o Rio Grande do Sul em março de 1858, registra a importância folclórica do chimarrão: "O símbolo da paz, da concórdia, do completo entendimento – o mate! Todos os presentes tomaram o mate. Não se creia, todavia, que cada um tivesse sua bomba e sua cuia própria; nada disso! Assim perderia o mate toda a sua mística significação. Acontece com a cuia de mate como à tabaqueira. Esta anda de nariz em nariz e aquela de boca em boca.
Primeiro sorveu um velho capitão. Depois um jovem, um pardo decente – o nome do mulato não se deve escrever; depois eu, depois o "spahi", depois um mestiço de índio e afinal um português, todos pela ordem. Não há nisso, nenhuma pretensão de precedência, nenhum senhor e criado; é uma espécie de serviço divino, uma piedosa obra cristã, um comunismo moral, uma fraternidade verdadeiramente nobre, espiritualizada! Todos os homens se tornam irmãos, todos tomam o mate em comum!" (Viagem pelo Sul do Brasil, 1.º, 191. Rio de Janeiro, 1953).

Uma roda de chimarrão é um momento de descontração, fazendo parte de um ritual indispensável para unir gerações. O mate pode ser tomado de três maneiras: solito (isoladamente), parceria (uma companheira ou companheiro) e em roda (em grupo).
O mate solito faz parte da cultura do homem que não precisa de estímulo maior para matear do que sua própria vontade. Pode-se dizer que é o verdadeiro mateador, ao contrário do mate de parceria, em que a pessoa espera por um ou dois companheiros. É na roda de mate, porém, que esta tradição conquistou seu apogeu, agrupando pessoas em torno de uma mesma ação: chimarrear.
Aos navegantes de primeira viagem, um aviso: nunca peça um mate, por mais vontade que tenha. Poderá sugeri-lo de forma sutil, esperando que lhe ofereçam. Há um respeito mítico nas rodas de mate.

Análises e estudos sobre a erva-mate têm revelado uma composição que identifica diversas propriedades nutritivas, fisiológicas e medicinais no produto, o que lhe confere um grande potencial de aproveitamento. O mestre em botânica Renato Kaspary em publicação de 1991 sobre erva-mate e Eunice Valduga, em dissertação para obtenção do grau de mestre (95), trazem várias informações a respeito.
Na constituição química da erva-mate, aparecem:
Alcalóides (cafeína, metilxantina, teofilina e teobromina), taninos (ácidos fólico e cafeico), vitaminas (A, Bi, B2, C e E), sais minerais (alumínio, cálcio, fósforo, ferro, magnésio, manganês e potássio), proteínas (aminoácidos essenciais), glicídeos (frutose, glucose, rafinose e sacarose), lipídeos (óleos essenciais e substâncias ceráceas), além de celulose, dextrina, sacarina e gomas.


Curtindo a cuia Cevando o Mate
Antes de tu ires mateando, tens que dar um trato na cuia.
Seguem abaixo orientações para isso:
Curte uma cuia enchendo-a de erva-mate pura ou misturada com cinza vegetal e água quente. Este pirão deve permanecer por dois ou três dias, sempre úmido, para que fique bem curtida, impregnando o gosto da erva em suas paredes. A Cinza é para dar maior resistência ao porongo.
Passando o tempo determinado, retira-se a erva-mate da cuia, raspando com uma colher, para eliminar alguns baraços que tenham ficado.
Enxágua-se com água quente e estará curada ou curtida, pronta para entrar em uso. O mate ou cuia se cura cevando,isto é, à medida que vai sendo usada vai dando melhores mates.
Preparando o Chimarrão
1º Coloque a erva dentro da cuia. Incline-a um pouco e abafe com a mão em diagonal.
2º Coloque água morna com muito cuidado e com a cuia inclinada e deixe o erva absorver toda a água
3º Ainda com a cuia inclinada, coloque a bomba devagar. Deve-se tapar com o dedo o bico da cuia na inserção
4º Arrume a bomba conforme o seu gosto, não esquecendo de virar o bico da bomba para o lado de fora da cuia. Pronto !
Agora é só saborear o seu autêntico chimarrão.









Os dez mandamentos do chimarrão
1) Não peças açúcar no mate
2) Não digas que o chimarrão é anti-higiênico
3) Não digas que o mate está quente demais
4) Não deixes um mate pela metade
5) Não te envergonhes do "ronco" no fim do mate
6) Não mexas na bomba
7) Não alteres a ordem em que o mate é servido
8) Não "durmas" com a cuia na mão
9) Não condenes o dono da casa por tomar o 1º mate
10) Não digas que chimarrão dá câncer na garganta

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Fotos

Fotos da 8ª Edição do Festival Mundial do Folclore
Promoção do Grupo de Arte os Chimangos
Postado em 04/06/2010






















Fotos Vilmar Hampel
Foto do inverno caçapavano
Postado em 04/06/2010
















Fotos Vilmar Hampel
Pôr do sol em Caçapava do Sul tendo ao fundo a Igreja Matriz
Postado em 04/06/2010
















Fotos Vilmar Hampel
Fotos da Minas do Camaquã distante aproximadamente 60km do centro de Caçapava do Sul
Postado em 04/06/2010   
Fotos Vilmar Hampel



















segunda-feira, 31 de maio de 2010

05/06/2010 - Programa sobre o cavalo


Os fósseis mais antigos de troncos primitivos do cavalo são originários da América do Norte. Como se vê, o berço do cavalo foi a América do Norte, há 50 milhões de anos. Antes do ano 1500 da nossa era, não havia cavalos nas Américas. Não existe, nas línguas originais do Continente Americano, nenhum termo que signifique cavalo. Todos os vocábulos que atualmente existem são derivações da palavra caballo do espanhol.
Nas escritas dos sumérios, hititas, assírios, babilônicos, hunos e ávaros já existe esse vocábulo há muitos séculos antes dos mongóis, egípcios, indianos, gregos, romanos e chineses. Os primeiros cavalos que chegaram no Continente Americano, mais precisamente no México, foram trazidos por Hernán Cortés, em 1519. Eram animais tão estranhos que assustaram os habitantes locais. Cobertos de pesadas armaduras, pareciam verdadeiras máquinas de destruição, blindadas e indestrutíveis.
 
 
Conta, a História, que o mesmo pavor tiveram os gregos, que também não conheciam o cavalo, ao serem invadidos pelos mongóis. Seria a origem da lenda dos Centauros. É idéia generalizada de que quem trouxe o cavalo para a América do Sul foi Don Pedro de Mendoza. Segundo os belíssimos versos do poeta José Curbelo – a beleza dispensa a verdade – era um zaino colorado:
“O cavalo tem chegado
com Don Pedro de Mendoza.
Sobre a pampa grandiosa
logo se tem multiplicado.
Trazia um zaino colorado
que quando desembarcou
junto a Riachuelo montou,
e penso que foi o primeiro,
que respirando o Pampeiro,
estas campinas cruzou”.
A idéia de que foi Don Pedro de Mendoza quem trouxe o cavalo para a América do Sul, hoje em dia não é mais aceita. Conforme pesquisas de Federico Oberti, Mendoza não deixou cavalos em Buenos Aires. Foi na segunda viagem de Colombo que trouxeram os primeiros cavalos para cá, vindos da Espanha. Segundo os historiadores, foi a primeira expedição verdadeiramente colonizadora: dezessete veleiros e entre 25 e 30 cavalos.
No seu livro El gaucho, Fernando O. Assunção afirma: “Quase seguramente foram, como mínimo, entre vinte e cinco a trinta cavalos embarcados. Esta quantidade está documentada detalhadamente por um pergaminho real datado no dia 23 de maio de 1493, em Barcelona, em que os Reis Católicos Isabel e Fernando ordenam que: ‘Entre a gente que mandamos ir na dita armada, temos concordado que sejam vinte e cinco lanças ginetes, a cavalo, por onde vos mandamos que entre a gente da irmandade que está nesse reino de Granada escolhais as ditas vinte lanças, que sejam homens seguros e confiáveis e que vão com boa vontade, e cinco deles levem cavalgaduras de reserva e que as ditas cavalgaduras de reserva que levam sejam éguas.’ ”
Em menos de oitenta anos, o rebanho cavalar do Sul da América do Sul, em especial o Pampa argentino e a Campanha rio-grandense, chegou a muitos milhares de cabeças. Só para se ter uma idéia da enorme quantidade de cavalos que deveria existir nessas regiões, em 1754 Bartolomeu Chevar levou do Rio Grande do Sul para Minas, 3.780 mulas. Para haver 3.780 mulas deveriam existir muitas éguas, já que a mula é um animal híbrido e estéril. Ainda em 1768, quando os jesuítas foram expulsos, só na região das Missões existia perto de duzentos mil cavalos, mesmo depois dos rebanhos terem sido saqueados pelos índios infiéis que iam até as proximidades dos “Povos” fazer grandes arrebatamentos para vender aos portugueses. Tal era a quantidade existente, informa José Hansel (“A pérola das reduções jesuíticas”), que a quebra era logo compensada pela reprodução.
Para o gaúcho, o cavalo é o "animal", por excelência, usado quase que exclusivamente para montaria. Já o índio rio-grandense, vencido o temor que o animal desconhecido lhe causava, cavalgava altivamente pelas coxilhas, montando "em pêlo" ou, mais tarde, como mostram desenhos do pintor Debret, num tipo de sela primitivo: num "xergão" sobre o qual havia uma "carona", presa por uma espécie de "cincha", governando o cavalo por uma corda que lhe era amarrada no queixo.
Hoje os arreios, isto é, as peças necessárias para encilhar o cavalo, os chamados "aperos" ou "preparos" são bem mais complexos. Distinguem-se os aperos da cabeça e os de montaria.
Toda a cultura gaúcha está embasada no cavalo. Até na sua filosofia de vida abundam as comparações com esse animal. Quando o gaúcho quer dar um exemplo de precaução, diz: “Nunca boleie a perna em rancho estranho sem dar o ‘Ó de casa!”. Significa não apear do cavalo sem que primeiro apareça alguma pessoa da morada. É para essa pessoa acalmar os cachorros. Outro exemplo: “Ao começar a encilhar um cavalo, a primeira peça dos arreios que se põe é o freio”. O cavalo enfrenado, em caso de urgência está em condições de ser montado em pêlo, mas, se estiver só encilhado, sem o freio, não serve para nada. Mais um: “Não fique diante dos bois, atrás dos cavalos, nem perto dos superiores”. Os bois dão chifradas; os cavalos, coices e os superiores, puxões de orelhas.
Esse amor ao cavalo explica porque ele não é consumido como alimento. Nem os bárbaros de Átila comiam carne de cavalo. Ninguém come um amigo! Seria quase um canibalismo.
A grande maioria dos conselhos gaúchos estão relacionados com o cavalo, seu comportamento ou afins: lidas campeiras, arreios. Aqui vão alguns, colhidos do livro Mala de poncho, de Raul Annes Gonçalves:
“Desconfiado como bagual torto.” (Cego de um olho)
“Andar com as cinchas nas virilhas.” (Andar mal de finanças)
“Cavalo maneado também pasta.” (Alusão ao homem casado que namora)
A maneira de falar do gaúcho antigo chegou de forma impressionante até nossos dias. Mesmo nos maiores centros urbanos do Estado, dezenas de palavras oriundas da lida campeira continuam sendo usadas com significado paralelo ao original.
Também chegaram até nossos dias a música, os payadores e a poesia gaúcha. Simões Lopes Neto no seu Cancioneiro Guasca, antologia da música popular gaúcha do passado, mostra a atenção que os habitantes do interior tinham pelo gaúcho. Muitas pessoas do interior, ainda hoje ligadas diretamente ou indiretamente ao campo, compõem músicas e fazem poesias e trovas a maneira do gaúcho.
Até hoje, muito embora algumas tentativas, o cavalo ainda não pode ser substituído por máquinas nas lidas de campo.
Estas o ajudam. Estas ajudam muito, mas ainda não podem fazer o que o cavalo faz, como por exemplo, um aparte no rodeio ou numa porteira de mangueira. Além disso, o cavalo é o ingrediente que maiores belezas e alegrias produzem dentro dos trabalhos de uma estância. Ë belo, é ágil, é inteligente, é dócil, é veloz, é vaidoso, é forte, enfim nos proporciona momentos de verdadeiro encantamento, principalmente quando, em seu lombo, praticamos as mais difíceis, porém mais emotivas e alegres lidas, como o tiro de laço e o aparte, que hoje os "Crioulistas"apelidaram de "Paleteada" .